I
Bocas desmaiadas,
De sono escancaradas,
Viajam de volta para casa
Avenida afora,
Enquanto
Cabeças pendidas,
Em sonolência contrita,
Dormem o sono dos justos,
Nessa hora
Que se prolonga
E devora
O resto do dia
E das horas.
II
Vogam,
Em meio a lixos
E detritos,
Antigos destroços
De outrora;
De viagens,
Tratados, ilhas
E tordesilhas,
De tantas linhas,
Faixas, buzinas e sirenes
Dos que voltam para casa
Infrenes e sem leme.
Vogam
Tiros,
Gritos e vozes
Em meio ao martírio
De quem morre anônimo
Sem nunca ter lutado
Contra mouros ou assírios.
Vogam
Santas cruzes
E arcabuzes
A perpetrarem
O vilipêndio
De missas
Estandartes,
E incêndios,
Dos massacres
Que catalogam
A cidade.
III
Tudo que é perene
É só mais uma forma
Do provisório
Neste empório
Que é a história.
Por isto este mar,
Há muito seco,
Embora infindo,
Que guarda seus ecos
E os endereços
Marítimos ou citadinos
De tantos vascos,
Marcos, pólos e gamas,
Zhengs, vicentes,
Pessanhas, janszs,
Mendonças, lischontens,
Nunes, nunos e homens,
Sem glória e sucesso
Que voltam para casa
De mares, bares e azares.
Por isto este mar,
De quem
Não conseguiu regressar
E que hoje,
Sem canto ou narrativa,
Retorna para casa,
À deriva,
Em meio a vagas
Que aportam,
Em chamas,
As frotas soçobradas,
Lâmina
Que aflige e inflige
A chaga escusa,
Ibero-americana,
De toda uma raça chacinada,
Os becos e logradouros
De ocaso,
Esquecimento e atraso
Que não encontram
Escoadouro.
Poema modificado após ler o belíssimo "Um dia quebrarei alguns ventos do norte".
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