quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Leão

















Todo o dia levanto-me,
Pulo da cama ouvindo, lá fora,
O rugido do leão.
Escovo os dentes, visto-me,
Preparo o café, enquanto ele
Vai de um lado a outro, esfaimado,
Numa infatigável faina de devoração.
Que fazer? Não acordar?
Não levantar pra trabalhar ou rezar?
Não há como!
Há sempre o inelutável
Do despertador, de homens e ambições
Enrodilhando-se-nos,
Espreitando-nos nas esquinas,
Na savana do coração.
Não há como fugir,
Amansar o leão,
Pô-lo numa coleira de circo,
Numa jaula de picadeiro;
O leão é cobra!
Todos os dias saio para matá-lo;
Visto-me, perfumo-me para isso,
Em frente ao espelho, penteando o cabelo,
Organizando a agenda, apertando
O nó da gravata, enrolando
Uma maçã em papel,
Desviando munição e armamento.
Todos os dias o esfaqueio,
Esperando o momento derradeiro
Em que terei de esquartejar-lhe o ventre,
Comer-lhe as tripas, sujar-me
De seu sangue e empalhar uma cabeça,
Que se parecerá com a minha,
Na parede alva da sala.
Então terei vencido:
Serei pior!

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