sábado, 16 de julho de 2016

Dissecar-se

Dissecar as próprias pernas
É como eviscerar
A mente e o coração,
Adentrar quartos
E cavernas.

É transpor as censuras
E nos ver ainda
Como éramos antes
Das acusações
E das recusas.

É ver poços e delírios
Aonde vão beber
A mais profunda água
As feras apascentadas
Pelo poeta maldito.

É ferir a própria carne
E ver as entranhas
Que encerram o ser
Feito de vísceras
Repletas de aves e infâncias.

Dissecar o próprio corpo
É como trazer à vida
Aquilo que jamais
Foi esquecido ou morto -
O fratricida!

É afundar em pântanos
E ressurgir perjuro,
Livre de demônios e santos,
Feito apenas de músculos,
Lutos e sangue.

É ser guiado
Ao coração do mundo
Por estradas
Repletas de riscos
E encruzilhadas.

É ir por um caminho
Ladeado por rochas
E precipícios
Que não conhecem
Verdades ou destinos.

Dissecar as próprias vísceras
É ser conduzido
Até às veias
De quem fura os olhos
E corta a própria orelha.

É adentrar
A casa de madeira,
Deitar no banco de pedra
E dormir no silêncio
Do nada e da treva.