sexta-feira, 24 de julho de 2015

Paraíso perdido

O paraíso
Nunca foi perdido
Nós é que vamos
Perdidos nele.

A vez primeira
Em que me tornei
Um passarinho
Foi naquela jabuticabeira.

Foi de manhã
Num domingo
Quando me tornei
Ainda mais lindo.

Beijo o mundo
Inocente
A tudo pertencente
Beijo-o álacre
Sem nenhum milagre.

Tomo-me
De tamanha simplicidade
E sinto-me
Tão jovem
Que já não tenho idade.

Meu presente
São os longes
Que não vivi outrora
Por isso me sinto
Tão ausente
Solto em todo o ente.

Meu passado
É tão próximo
Que o já não lembro.
Fiz dele um desenho
Que ora apago,
Ora xilogravo
Nas asas de um pássaro,

E o futuro dos homens
Não me angustia
Ou consome
Se resume a este dia
A tudo o que é
E some.

Cobras e lagartos
Conversam comigo.
Como todos os frutos
E nenhum é proibido.

Passo por corredores,
Estradas e escadas
Sentindo o rasto
De lavanda e gasolina.
Trepo com pretas e polacas
E faço negócios da china.

Sou um novo adão
E ando nu, ao léu,
Nas asas de um avião
Ou das borboletas
A adejarem
As flores de um vergel
No paraíso perdido.

Bebo de todas as fontes.
Mato aqui
Toda a minha sede e fome
A beijar liliths, santas e marias,
A dar festas, risos e alegria,
A brincar com diabos e meninos,
Os mais belos que já vi.

Ter medo de quê
Se jamais saberemos
Se o boticário nos preparou
Um perfume ou veneno?

Nada me impressiona
E fico atento,
Sensível a tudo
Que, visível,
Me emociona,

Porque é bom
Ouvir as ondas
Batendo no cais,
Amar, cantar
Sorrindo,
Para depois morrer
Como os pardais
À beira do mar,
À beira do lindo.